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O peso que ninguém vê (parte 1)

Ou: por que tantas mulheres estão à beira de um colapso silencioso

Tem dias em que o caos fala mais alto que qualquer mantra.

E ele fala com razão.


Ser mulher em 2025 é equilibrar mil pratos invisíveis enquanto o mundo cobra que você sorria, produza, ame com gentileza, alimente com afeto, organize com eficiência, recupere o corpo em 6 semanas, não cobre demais, não reclame demais, não espere demais. Só entregue. E dê conta.


Mas e se você não quiser dar conta?


E antes que alguém diga “ah, mas a minha mãe, minha avó... elas davam conta de tudo, criavam 10 filhos e ainda costuravam cortina com a criança no colo” 

Sim. Elas davam.

Mas tinham escolha?


Quem não dava conta era chamada de fraca, ingrata, descompensada.

E olha, nem precisa voltar muito no tempo.

Hoje em dia ainda é assim.

A diferença é que agora a gente tem vídeo no Instagram explicando a diferença entre “assertividade feminina” e “mulher difícil”.

Uau, progresso.


E se for pra entrar nesse vespeiro de verdade, a gente vai cair direto em outras camadas:

na lógica de sobrevivência que virou padrão,

na romantização da exaustão,

na criação dos irmãos mais novos pelos irmãos mais velhos,

na educação punitiva,

na falta de rede,

no “deixa que eu faço” virando sentença...


E, claro, nas fantasias de fuga que a gente inventa pra sobreviver.


Vai dizer que você nunca pensou:"ai, queria ser aquela mulher do campo, do avental de linho, da rotina slow com as crianças, do pão caseiro assando no forno, do chá da tarde no sol da varanda"

Eu já pensei.

Teve dia que eu só queria isso.

E teve dia que eu até culpei quem queimou o sutiã.


Desculpa, tá?

Mas quem nunca?


Só que no fundo, a gente não quer abrir mão dos nossos direitos.

A gente quer é descansar sem abrir mão da dignidade.

A gente quer o pão no forno, o chá quente E o próprio dinheiro na conta, a liberdade de sair, de existir sem precisar pedir.

Porque essa tendência tradwife aí pode até parecer doce.

Mas depender 100% de um marido não é poesia bucólica. É risco.

E a gente sabe disso. Sabe com o corpo, sabe com o histórico, sabe com o medo.


Agora, voltando.


A carga mental não tem crachá. Ela não chega avisando.

Ela simplesmente toma o seu dia. E o seu corpo. E sua libido.

E o pouco de paz que você tinha antes de pedir pra alguém guardar a comida na geladeira e descobrir que a pessoa deixou a panela aberta, sem tampa, jogada de qualquer jeito. Porque não é só guardar. É pensar em como guardar, quando, onde, por que — e rever depois. O clássico: se você não fizer, ninguém faz. Mas se fizer, ainda tem que aceitar o jeito torto que o outro “contribuiu”.


Você não está exagerando. Você está cansada.

A carga mental é a soma de tudo que você precisa lembrar para que a vida funcione mesmo que ninguém veja. Mesmo que ninguém valorize. Mesmo que você mesma tenha aprendido a chamar isso de “coisa pouca”.


E é aqui que a coisa aperta pra quem materna.

Porque quando o bebê nasce, o mundo espera que uma mãe renasça pronta. Só que o sistema não oferece rede, o parceiro não foi educado pra ver (muito menos pra agir), a sociedade não considera cuidado como trabalho. 


E aí sobra pra quem?

Pra quem já sangrou, pra quem não dorme, pra quem tenta sobreviver com um peito latejando e o corpo ainda cicatrizando.


Seja bem-vinda ao clube das mulheres que cansaram de pedir ajuda.

Que deixaram de pedir porque sempre que pedem, precisam esperar o timing do outro.

E ainda assim, o lixo fica aberto no chão. O que é óbvio vira "exigente demais".


A carga mental, quando somada ao cuidado invisível, vira um esgotamento que parece culpa.

Mas é estrutura.


E você? O que anda carregando calada, achando que é normal?



 
 
 

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BEATRIZ FACIO, PhD, doula

+46 73 635 80 29 | doulabeatrizfacio@gmail.com 

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